A um pulo do Porto, a somente 40 minutos, está
Amarante, a cidade conhecida pelo seu santo, pela sua ponte sobre o rio Tâmega,
por Teixeira de Pascoes e Amadeo de Souza-Cardoso e… pelas suas especialidades
de doçaria conventual.
Apesar de ser habitada desde a Idade da pedra,
Amarante só começou a ser conhecida depois de o eclesiástico português Gonçalo
de Amarante (1187-1259) ter fixado residência na localidade após o seu regresso
da peregrinação de 14 anos a Roma e à Terra Santa.
Ergueu
uma pequena ermida sob a invocação de Nossa
Senhora da Assunção e ali se recolheu como eremita, consagrando o tempo à
oração e à penitência. Durante o seu ministério Gonçalo operou muitas
conversões, conduzindo o povo à prática de uma autêntica vida cristã, sem
esquecer de os promover socialmente em muitos aspetos. A ele se deve a
construção de uma ponte em granito sobre o rio Tâmega, angariando pessoalmente
donativos junto dos moradores mais abastados – a ponte que vemos atualmente é
porém de 1782, pois a velha ponte cedera duas décadas antes devido a uma cheia
excecional do rio. O cruzeiro que aí se encontrava, conhecido por Senhor da Boa
Passagem, conseguiu ser retirado uma hora antes da catástrofe, tendo sido
colocado mais tarde na janela de um recanto da Igreja
de São Gonçalo, ficando em seu lugar a Mãe de Deus, a Senhora da Ponte.
Após
a morte. Gonçalo de Amarante foi sepultado na ermida, continuando a efetuar-se
muitos milagres, atribuídos à sua intercessão. No século XVI, o rei João III e
a sua esposa D. Catarina de Áustria mandaram erguer um convento dominicano com
igreja que ainda hoje em dia é o maior monumento de Amarante. As obras iniciaram-se
em 1543, tendo-se prolongado até ao século XVIII,
com intervenções no século XX.
A ponte de Amarante foi palco de umas das
grandes batalhas durante as Segundas Invasões Francesas, tendo sido valorosamente
defendida durante 14 dias em 1809 pelo do Marechal General Wellesley e pelo
General Silveira a quem foi dado o título de Conde de Amarante – aliás, a própria
vila (que passou a cidade em 1985) foi agraciada com o colar da Ordem
Militar da Torre e Espada, do Valor, Lealdade e Mérito que reflete no seu
brasão municipal. Para fazer as barricadas para a defesa da ponte, foram usados
os móveis da casa senhorial que estava construída mesmo à boca da ponte, a Casa
da Calçada.
A Casa da Calçada
Sobranceira
ao rio Tâmega e com entrada junto à boca do aponte, ergue-se a Casa da Calçada,
construída no século XVI para ser um dos principais palácios do Conde
do Redondo que em 1473 recebeu
por doação o Concelho de Gouveia de Riba Tâmega, sendo-lhe atribuído foral em 1513 pelo
Rei D.
Manuel.
Durante
as invasões
francesas serviu
de quartel-general dos Franceses durante 4 – 5 dias; após a retirada dos
franceses albergou os comandos aliados
portugueses e ingleses. No entanto, ao terceiro dia de batalha, o edifício foi
destruído pelo fogo devido aos bombardeamentos das tropas napoleónicas lideradas
pelo Marechal Soult.
Nos
anos 20 do século XIX, a Casa da Calçada foi adquirida pela família Lago
Cerqueira, que realizou as obras de recuperação do edifício principal e dos anexos.
A casa sofre um grande incêndio em 1916, tendo sido recuperada pelo Dr. António
do Lago Cerqueira, que lhe mantendo a traça barroca
e lhe associa elementos do neoclassicismo do
início do século XX.
Republicano
convicto, António do Lago Cerqueira foi o primeiro Presidente da Câmara de
Amarante, após a implantação da
República Portuguesa em 1910. Amigo de Afonso
Costa, Bernardino
Machado e António
Maria da Silva, foi deputado e Ministro do Trabalho e dos Negócios
Estrangeiros. Por razões políticas, abandona Portugal e exila-se
em Paris onde
entra em contacto com novas técnicas de plantação de vinha no Curso de
Viticultura e Vinificação que frequenta no Instituto Nacional de Agronomia.
Amnistiado
em 1932, regressa à Casa da Calçada, onde inicia a produção dos Vinhos e
Aguardentes das Caves da Calçada, que atingem grande sucesso sendo inclusivamente
exportados para o Brasil e
para as Colónias Ultramarinas Portuguesas. Nesta época a Casa da Calçada serve
de ponto de encontro para políticos e intelectuais.
Após
o falecimento de António do Lago Cerqueira em 1945, a Casa da Calçada fica
desocupada. É comprada por António Manuel Mota, que sonha com um hotel que
nunca concretiza. Os filhos avançam com o sonho do pai, a recuperação da Casa
da Calçada (e a sua transformação em estalagem), dos jardins e da respetiva vinha.
As obras são iniciadas nos anos 90. Paralelamente retomam a produção de vinhos verdes
de alta qualidade. Em 2001, a Casa da Calçada abre com 30 quartos e, em
Novembro de 2003, passa a integrar a conceituada cadeia de hotéis Relais
& Châteaux.
Ao entrarmos na Casa
da Calçada sentimo-nos em casa. Os quartos estão decorados num estilo romântico,
transmitindo através do mobiliário, dos tecidos e dos detalhes decorativos um
ambiente de casa de família. Os quartos da tipologia de luxo superior e as suites
executivas têm vista privilegiada para o rio e para o convento.
No entanto, não se
escolhe a Casa da Calçada só para pernoitar. Aqui a Gastronomia escreve-se
letra maiúscula: a criatividade dos seus diversos chefes e a qualidade da sua cozinha, baseada na cozinha regional
portuguesa e nos sabores mediterrânicos, fazem com que o Restaurante Largo do
Paço, atualmente a cozinha dirigido pelo chefe André Silva, seja uma das
“catedrais” gastronómicas de Portugal e seja contemplado com uma estrela
Michelin desde 2005, só com uma interrupção de um ano. Aliás, são muitos os aspirantes a chefe que
querem vir trabalhar no Largo do Paço para aí fazerem a sua formação. A
garrafeira, orientada pelo sommelier Adácio Ribeiro, tem uma grande
variedade de escolha num ambiente moderno com temperatura constante a rondar os
17º C.
Amarante e a Casa da
Calçada fazem com que uma visita à cidade fique para sempre marcada na memória
de quem por lá passa.